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Maioria do STF delimita direito de greve de servidor

13/04/2007 11:04 | Pedido

    A greve no funcionalismo público continua sem regras, mas por pouco tempo. Um pedido de vista do ministro Joaquim Barbosa adiou a definição do julgamento de dois Mandados de Injunção, pelo Supremo Tribunal Federal, sobre a regulamentação da greve dos servidores públicos.

    Apesar do adiamento, o STF dificilmente não decidirá por aplicar ao serviço público as mesmas limitações do trabalhador da área privada enquanto o Congresso Nacional protela a aprovação de lei que regulamentaria esse direito: são sete votos a favor da aplicação da Lei de Greve (Lei federal 7.783/89) e um contra. Isso porque, mesmo com o pedido de vista, cinco ministros adiantaram seus votos.

    Para os ministros Eros Grau, Gilmar Mendes, Celso de Mello, Sepúlveda Pertence, Carlos Ayres Britto, Cármen Lúcia e Cezar Peluso, o Judiciário pode apontar as regras a ser seguidas nos casos em que um direito constitucional não é exercido por conta da omissão legislativa. A Constituição Federal não é um estatuto subordinado à vontade do legislador comum, afirmou Celso de Mello.

    A discussão é travada em duas ações. O primeiro Mandado de Injunção, de número 670, foi ajuizado pelo Sindicato dos Servidores Policiais Civis do Espírito Santo contra o Congresso Nacional e pretende assegurar aos seus filiados o exercício do direito de greve. O segundo, de número 712, foi impetrado pelo Sindicato dos Trabalhadores do Poder Judiciário do Pará pelo mesmo motivo.

    O ministro Ricardo Lewandowski, que trouxe seu voto a julgamento nesta quinta-feira (12/4), garantiu o exercício de greve aos servidores, mas não concordou com a aplicação da Lei de Greve (7.783/89) para o funcionalismo.

    Lewandowski determinou ao governo do Espírito Santo (no caso dos policiais) e ao Tribunal de Justiça do Pará (no caso dos servidores do Judiciário) que se abstenham de adotar medidas que inviabilizem ou limitem o direito de greve, tais como o corte do ponto dos servidores, imposição de multa pecuniária diária ou o desconto dos dias parados.

    Ou seja, reconheceu o direito de greve e a efetiva aplicação do Mandado de Injunção no lugar da mera declaração de mora, mas não aceitou a tese da aplicação das regras da iniciativa privada. Não vejo semelhança relevante entre a greve dos trabalhadores do setor privado e a greve dos servidores públicos. Com efeito, não reconheço, data vênia, identidade jurídica entre os dois fenômenos que autorize a aplicação da Lei 7.783/89 ao serviço público, sustentou o ministro.

    O ministro ainda ressaltou que a lei aplicada à iniciativa privada não serviria para ser aplicada genericamente. Parece inquestionável que uma greve de professores do ensino fundamental, por exemplo, não deve ter o mesmo tratamento que o dispensado à uma greve de controladores de vôo ou de profissionais da saúde pública. Cada uma dessas paralisações requer regulamentação que atenda às suas especificidades e ao mesmo tempo resguarde os interesses da coletividade.

    Mandado de Injunção

    Os ministros Eros Grau e Gilmar Mendes que propuseram originalmente que a greve do funcionalismo deve se sujeitar às mesmas regras da iniciativa privada, ao menos até que o Congresso regulamente o direito constitucional reforçaram suas posições após o voto de Lewandowski.

    Para o ministro Gilmar Mendes, a falta de regras dá margem a negociações heterodoxas e a proibição do desconto dos dias parados acaba por representar um acréscimo em termos de férias para os servidores. A não atuação do tribunal neste caso se configuraria quase que como uma espécie de omissão judicial, sustentou. Gilmar afirmou que o julgamento não trata de uma revisão de toda e qualquer orientação quanto ao Mandado de Injunção, mas que a falta de regras dá margem ao abuso.

    Ao pedir vista, o ministro Joaquim Barbosa defendeu que o foro adequado para a discussão não é o Judiciário e afirmou que o Congresso Nacional tem duas audiências marcadas para discutir o tema nas próximas semanas. E perguntou se não seria o caso de esperar a discussão legislativa, antes de decidir o tema. O ministro Gilmar Mendes, então, lembrou que já se espera uma decisão neste caso há 19 anos. Em seguida, os ministros Celso de Mello, Sepúlveda Pertence, Carlos Britto, Cármen Lúcia e Cezar Peluso adiantaram os votos.

    O decano da Corte, ministro Pertence, lembrou que a greve nunca esperou pela lei para se manifestar. Logo, a questão da regulamentação deveria ser enfrentada.

    Celso de Mello sustentou que a jurisprudência do STF evoluiu no sentido positivo, de dar ao Mandado de Injunção o sentido previsto pelo legislador constituinte. De acordo com o ministro, até então o Supremo permaneceu numa posição de virtual abstenção. Carlos Britto também acompanhou o entendimento de que deve se aplicar a lei neste caso.

    A ministra Cármen Lúcia lembrou que a falta de lei que venha regulamentar a greve no funcionalismo já atravessou cinco legislaturas. Se há o abuso do poder de legislar, esse é um caso de abuso do poder de não legislar, afirmou. Cármen Lúcia ressaltou que acompanha o entendimento majoritário, mas sem eficácia erga omnes. Ou seja, sem aplicação para todos os casos, e sim apenas aos dois Mandados de Injunção em discussão. E observou que há 13 anos o STF já tinha declarado a mora do legislativo para regulamentar a matéria.

    Em seguida, o ministro Cezar Peluso ponderou que não é possível reconhecer o direito de pagamento dos dias parados, já que um serviço deixou de ser prestado. Outro ponto por Peluso foi sobre a essencialidade do serviço público. Os ministros discutiram a aplicabilidade dos artigos 10 e 11 da Lei 7.783/89 e reconheceram que todo serviço público é considerado essencial. Por isso, deveria ser mantido parte em funcionamento.

    Decisão provisória

    Suspenso o julgamento do mérito, o ministro Eros Grau propôs que o tribunal deferisse uma medida cautelar, de ofício, para garantir a regulamentação da matéria. Depois de uma acalorada discussão em plenário, a proposta foi rejeitada. O entendimento majoritário foi o de que não cabe cautelar em Mandado de Injunção.

    Lei a caminho

    Enquanto o Supremo não define a questão, o advogado-geral da União, ministro José Antonio Dias Toffoli, anunciou na quinta-feira passada que o Palácio do Planalto deve enviar ao Congresso, ainda este mês, o projeto de lei para regulamentar o direito de greve de servidores públicos.

    Estamos trabalhando no anteprojeto junto ao Ministério do Planejamento, informou o ministro, que não omite a preocupação do governo com movimentos como o dos controladores de vôo.

    Embora prevista na Constituição de 1988, o direito de greve no funcionalismo até hoje não está regulamentado. Isso tem feito com que o poder público considere toda greve ilegal, enquanto os servidores cruzam os braços sem observar qualquer limitação do direito. Greve não pode virar férias, afirma Toffoli.

    Leia um dos votos do ministro Lewandowski

     MANDADO DE INJUNÇÃO 670-9 ESPÍRITO SANTO

    RELATOR:-MIN. MAURÍCIO CORRÊA

    IMPETRANTE:-SINDICATO DOS SERVIDORES POLICIAIS CIVIS DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO - SINDPOL

    ADVOGADOS:-HOMERO JUNGER MAFRA E OUTRO

    IMPETRADO:-CONGRESSO NACIONAL

    V O T O

    (VISTA)

    O Sr. Ministro RICARDO LEWANDOWSKI (Relator): Trata-se de mandado de injunção, com pedido de medida liminar, impetrado por SINDIPOL SINDICATO DOS SERVIDORES POLICIAIS CIVIS DO ESPÍRITO SANTO, contra omissão do Congresso Nacional, consistente na ausência de regulamentação do direito de greve dos servidores públicos, previsto no art. 37, VII, da Constituição de 1988.

    O impetrante narra, em suma, que deflagrou movimento grevista na Polícia Civil capixaba, após infrutíferas negociações com o Governo do Estado. Diz, ainda que, instado por este, o MM Juiz da Vara dos Feitos da Fazenda Pública Estadual, Dr. Eraldo Gomes de Azevedo, deferiu tutela antecipada em ação ordinária (...), impedindo o exercício do direito constitucional de greve por parte dos associados do impetrante (fl. 05).

    Destaca-se da referida decisão o seguinte trecho:

    ... diante do exposto, defiro, em parte, o pedido e determino a intimação do Sindipol, na pessoa do seu representante legal, de que a tutela antecipada deferida nos autos do presente processo, que proibiu o movimento paredista, ainda se encontra em vigor, sendo ilegítimo qualquer movimento grevista que porventura pretendam deflagrar e que a não obediência à ordem judicial emanada redundará, além da pena criminal correspondente, no corte do ponto de servidores, bem como na multa pecuniária diária a incidir sobre os dias parados que mantenho em R$ 10.000,00 (dez mil reais).

    Argumenta, mais, que, após o advento da Emenda Constitucional nº 19/98, passando a condicionar o exercício do direito de greve à edição de lei específica e não mais a lei complementar, caso claro da Lei de Greve específica, pugna-se como razoável a aplicação desta Lei ao caso concreto, analogamente, sem que se fira suscetibilidades, e impere o primado da legalidade (fl. 14).

    Requer o impetrante, ao final, seja o presente mandado de injunção julgado procedente, garantindo-se o exercício do direito de greve dos impetrantes com base na Lei Federal nº 7783/89, enquanto este direito não for regulamentado pelo Congresso Nacional; assim como sejam definitivamente banidos do mundo jurídico os efeitos da decisão proferida pelo Juízo Singular no Processo nº 024.010.028.918, anulando-se, definitivamente este processo, posto ferir de morte direito consagrado na Constituição Federal (fl. 15).

    O pedido de medida liminar foi indeferido à fl. 69.

    O Presidente do Congresso Nacional, em suas informações, sustentou, em síntese, ter o Supremo Tribunal Federal firmado o entendimento no sentido de que a finalidade a ser alcançada pela via da injunção resume-se à declaração, pelo Poder Judiciário, da ocorrência de omissão constitucional, a ser comunicada ao órgão legislativo inadimplente, para que promova a integração normativa do dispositivo constitucional nela objetivado (fl. 76).

    Aduz, ainda, a inexistência da alegada omissão por parte do Poder Legislativo, tendo em vista os inúmeras projetos de lei sobre o tema em tramitação no Congresso Nacional (fl. 78).

    A Procuradoria-Geral da República opinou pelo deferimento parcial do pedido, para que seja declarada a mora do Poder Legislativo, nos termos da jurisprudência da Corte sobre a matéria (fls. 81-83).

    Em petição de fls. 86-90, o impetrante informou a publicação da Lei estadual 7.311/2002, que regulamentou o direito de greve por parte dos servidores públicos estaduais, insistindo na procedência do presente mandado de injunção para garantir o exercício do direito de greve aos policiais civis com base na Lei federal 7.783/89 ou no mencionado diploma local, enquanto o Congresso Nacional não estabelecer normas gerais sobre a matéria.

    Na sessão plenária de 15.5.2003, o Relator, Ministro Maurício Corrêa, conheceu em parte da impetração e, nessa parte, concedeu a ordem, para certificar a mora do Congresso Nacional.

    Na sessão de 07.06.2006, o Ministro Gilmar Mendes, em voto-vista, conheceu do writ e acolheu a pretensão tão-somente no sentido de que se aplique a Lei nº 7.783/1989 enquanto a omissão não seja devidamente regulamentada por Lei específica para os servidores públicos.

    Pedi vista dos autos, para melhor refletir sobre a delicada questão, a qual passo a examinar em meu voto, que ora trago à apreciação do Plenário desta Casa.

    Preliminarmente, sublinho a especial relevância do pleito sob exame, porquanto, neste julgamento, encontra-se em causa precisamente a própria conformação que o Supremo Tribunal Federal emprestará a este inovador remédio constitucional.

    Não resta dúvida, a meu ver, de que é chegada a hora desta Corte avançar no sentido de conferir maior efetividade ao mandado de injunção, dando concreção a um dos mais importantes instrumentos de defesa dos direitos fundamentais concebidos pelo constituinte originário.

    E essa é visivelmente a tendência do STF, cuja jurisprudência acerca do instituto vem evoluindo de forma firme e progressiva, como, aliás, demonstram os votos dos eminentes Ministros que me antecederam no julgamento deste mandado de injunção.

    É bem verdade que, no passado, ainda no início dessa evolução jurisprudencial, os limites assinalados pelo Supremo à decisão judicial em mandado de injunção foram objeto de críticas por parte de alguns doutrinadores, que os consideravam excessivamente angustos. (1) Mas esses limites, sobre os quais me permito tecer algumas reflexões, foram sendo paulatinamente ampliados (veja-se, a propósito, acórdãos proferidos nos MIs 107-QO, Rel. Min. Moreira Alves; 168, Rel. Min. Sepúlveda Pertence; 232, Rel. Min. Moreira Alves; 235, Rel. Min. Moreira Alves; 283, Rel. Min. Sepúlveda Pertence; 284, Rel. Min. Marco Aurélio; 384, Rel. para o acórdão Min. Celso de Mello, entre outros).

    Revista Consultor Jurídico, 12 de abril de 2007

 

Fonte: Priscyla Costa e Rodrigo Haidar. Site Consultor Jurídico
 
 


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